segunda-feira, 27 de abril de 2009

A rampa da escola


Ladeada por fórmios vistosos e uma horta especialmente cultivada pelas mãozinhas curiosas das crianças, a rampa que dá acesso à estrutura da escola de minha filha nasce do portão de entrada e nos leva diariamente ao grande gramado, cenário das vivências dos pequenos alunos. É inevitável subí-la ou descê-la, esse curioso palco de movimentos, onde muito acontece, por onde todo mundo passa. Arrisco em dizer que ela parece ter vida, talvez até fale ou escute todas as conversas que nela se iniciam e quase nunca terminam. Como uma legítima rampa, com seus não-sei-quantos graus de inclinação, presta-se a ser uma passagem, simplesmente. Só que aparentemente.
Pras crianças é uma grande e desafiadora brincadeira, nela apostam corrida, descem pulando ou andando de ré. Engraçado é quando vão correndo e gritando pra sentir o som vibrar a cada passo forte. Dia desses fiz junto com minha filha e achei bem divertido (abafa, ninguém viu).
Pras mães é um perigo iminente, não é raro ouvir uma ou mais gritando inutilmente pros filhos terem cuidado pra não se esborracharem no chão. Mas eles caem mesmo assim, claro. De tempos em tempos a gente escuta aquele chororô - nessa hora a rampa fica aglomerada - , acode um joelho ralado, encoraja um rostinho desanimado. Mas no dia seguinte, de sorriso no rosto e curativo no corpo, quem caiu volta a se aventurar na amiga íngreme.
Se na descida todo santo ajuda, por outro lado, na hora da subida as grávidas vivem uma verdadeira tortura, e nesse caso falo com a propriedade de quem viveu isso recentemente. Acelera batimentos, arranca suspiros ofegantes, parece não ter fim. Nos dias de calor intenso não precisa estar grávida pra sentir o peso maior ao tentar escalá-la. O suor escorre e a gente quase morre de cansaço (ops, excluo os atletas deste momento).
Pras professoras, por sua vez, essa elevação deve ser a salvação. Explico: se você aumenta a distância de sua passada, a gravidade dá aquele empurrãozinho e você chega mais depressa ao destino, com poucas chances para o bate-papo. Então, pra quem está deixando o trabalho, nada melhor que sair com a pressa e a certeza de que não será parado por ninguém (leia-se "nenhuma daquelas mães malas sem alça que sempre querem falar alguma coisa sobre o filho, mesmo se está tudo correndo bem").
Num dia cinzento, chuvoso e sem aula, passei na frente da escola e parei para observar a rampa. Achei ela triste, solitária. Sem aquela bagunça toda dos dias úteis, coitadinha, ela estava lá, larga, imóvel e inútil. Engano meu. Na verdade, cumpria feliz mais uma de suas funções: ajudar a água da chuva a encontrar mais rapidamente o curso do rio.

2 comentários:

rosana disse...

Adorei o texto. Minha experiência com a descrita rampa também vale?
Então lá vai.....Essa rampa é difícil, cansa minhas pernas, faz meu coração acelerar, será que estou fora de forma? Não sei (rsrrsrs), mas também isso não tem a menor importancia. Subiria essa rampa mil vezes ao dia, mesmo sentindo as pernas doendo, porque a recompensa que me espera no final é a melhor emoção da vida. Ver a alegria da minha querida netinha, surpresa pela minha presença faz meu coração se encher de alegria. Adoro subir essa rampa!
Pra falar a verdade....estou com saudade da rampa!

Anônimo disse...

Lindo! Amei!
Estou emocionada, aliás como você nos faz sentir sempre.
Já ouvimos falar da "nossa rampa" mas nunca com olhar de mãe querida e poeta.
Obrigada Dani.
Obrigada Rampa.
Beijos Carol